sexta-feira, 24 de julho de 2020

Imprevistos de viagem

Artigo/Crónica por António Rego 

Não estou só neste hino cósmico que o tempo e o espaço entoam até ao infinito

Não é nenhum espanto fazer vinte e cinco anos de casado. Já fiz cinquenta de sacerdócio, recordo a frescura de alma na ordenação e penso que o tempo não fez envelhecer nada mas amadurecer razões e reforçar afetos. Gosto de sentir que ele enriquece mais do que desgasta, porque reforça motivos, depura decisões, olha para as pessoas e factos com nova clareza não repassada de desconfiança mas de alma lavada para sempre se renovar.
É talvez a frase mais importante dita por vezes com ligeireza: "Se tivesse de recomeçar tomaria o mesmo caminho." (não sei porquê mas o computador mandou aquela pequena frase que por vezes entra sem licença no nosso texto: "você ganhou"). Não ganhei nada mas alguma coisa se passou nesta floresta digital e que considera que correu bem. Não gosto de acasos ou fatalismos mas sempre me pergunto o que terá corrido bem sem eu o notar. Aqui relembro o atropelo constante de pessoas, factos e palavras. De pequenas coisas, gestos e encontros com que se compõe a nossa vida.
E se temos o hábito de em cada manhã entregarmos a Deus o dia que nasce integrado no seu grande projecto - que não abrangemos -, iremos aprendendo que afinal não existem insignificâncias e por isso toca a respirar e prosseguir caminho, pois embora não vejamos tudo claro sabemos que a nossa vida é mais do que um estreito túnel com um ponto de luz aparentemente inatingível. Hoje, com as "laudes" no livro e no coração, sei que não estou só neste hino cósmico que o tempo e o espaço entoam até ao infinito. Venham comigo os que tiveram paciência para seguir estas linhas.
Não falei de política, nem de religião ou desporto mas sinto que o caminho que piso tem saída mesmo com a muita poeira que se levanta e que me pede para lavar os olhos porque a viagem pode ser longa e dura.

Padre

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